O litoral brasileiro vive uma onda de obras de aterramento de praias. O Recife foi a mais recente cidade a anunciar planos de fazer esse tipo de intervenção. Especialistas ouvidos pelo g1 afirmam que as chamadas engordas têm vantagens, mas exigem estudos rigorosos para evitar danos ao meio ambiente.
Do Nordeste ao Sul do país, cidades litorâneas recorreram a obras de alargamento da faixa de areia para enfrentar a erosão costeira e o avanço do mar. São pelo menos 38,8 km de praias ampliadas artificialmente de 1998 para cá, segundo levantamento do g1. (veja o vídeo acima)
Há registros de engordas nos anos 1960, em Copacabana, no Rio de Janeiro e, em 1970, no Espírito Santo. Desde pelo menos 1998, elas se espalharam em diferentes regiões do país, por capitais e cidades de menor porte. Especialistas dizem que a opção pelas engordas se explica pelas vantagens em conter a erosão, se comparadas a outras técnicas, e por criarem espaço para turismo, mas há riscos de danos ambientais.
Recentemente, o Recife anunciou licitação para estudo e projeto de prolongamento da faixa de areia da orla. A vizinha Jaboatão dos Guararapes concluiu 5,9 km de engorda em 2013. A escolha da empresa que vai fazer a obra na Praia de Ponta Negra (Natal) está em andamento. Balneário Piçarras (SC) quer fazer a quarta intervenção do tipo no mesmo trecho. Florianópolis bancou três ampliações e está em Santa Catarina um dos mais famosos alargamentos de praias, o de Balneário Camboriú. A engorda em Matinhos (PR) gerou embates, mas foi concluída, já o projeto de João Pessoa (PB) foi suspenso.
O que é uma engorda: é a retirada de areia do fundo do mar (dragagem) e colocação na costa, alargando a faixa de areia. Também é possível depositar areia sob a água para alimentar o movimento de retirada e reposição de sedimentos feito pela maré. Essa obra, em geral, exige licenciamento ambiental estadual ou, dependendo do porte, apenas municipal.
Erosão costeira: o Brasil perdeu 15% ou 70 mil hectares de dunas, praias e areais entre 1985 e 2020, segundo o MapBiomas (rede composta por ONGs, universidades e empresas). Os motivos dessa redução vão desde a revegetação do topo das dunas (plantações e crescimento de grama por ação humana), ocupação por empreendimentos até a expansão de espécies invasoras e baixa inclusão de áreas costeiras em unidades de conservação.
De acordo com Pedro Walfir, professor e um dos coordenadores do MapBiomas, as engordas são consideradas alternativas positivas, sustentáveis e até necessárias para conter o avanço do mar, mantendo a possibilidade de ocupação da costa. Entretanto, essas intervenções podem causar impacto negativo se forem executadas sem os devidos estudos e projeções (entenda efeitos mais abaixo).
PERIGO Para o biólogo Paulo Horta, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a engorda é menos prejudicial do que a colocação de barreiras físicas na praia, mas prejudica a biodiversidade e pode causar mortandade de fauna e flora tanto na área doadora de areia quanto na que recebe aterro, além de ter um processo emissor de gases de efeito estufa.
Se a gente está precisando engordar as praias hoje é porque as praias estão passando fome. Fome causada pelo modelo de ocupação do ambiente costeiro, por causa do balanço de sedimento, que a gente está alterando, colocando barragens nos rios, por exemplo, que muda a entrada de sedimento na costa, e claro, por conta das mudanças climáticas, pela da elevação do nível do mar e da maior da frequência e intensidade de eventos extremos que aumentam o potencial erosivo do oceano no nosso litoral
— Paulo Horta, biólogo
Em março, a engorda de Copacabana completou 53 anos. Lá, o aterramento foi feito entre 1969 e 1971, e ampliou de 21 para 73 metros a distância entre os prédios e o mar. Após essa obra foi possível duplicar a Avenida Atlântica e construir calçadões, estacionamentos e mais pistas para circulação de veículos.
Já praia Central de Balneário Camboriú (SC) voltou a enfrentar problemas de erosão menos de um ano depois da obra. O mar “engoliu” 80 m de faixa de areia e apareceram “degraus” na faixa de areia.